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Vistoria de automóvel: Responsabilidade de quem?

21.03.2023 - Fonte: Por Jaqueline Wichineski dos Santos

SEGURO-GAUCHO (9)

Certo dia me deparei com o contato da minha corretora de seguros ao fazer um endosso para a troca do meu veículo, e, para minha surpresa, esta gentilmente disse que a companhia seguradora, devido à pandemia ocorrida nos anos de 2020/2021, mudou as regras para vistoria do veículo.

- Eu, prontamente: como assim? Mas, a pandemia não acabou?

Novamente gentilmente a corretora disse: - Pois é, mesmo com o fim da pandemia a seguradora pede que o segurado acesse um link (inteligência artificial) e faça ele mesmo.

Eu, que sou do mercado segurador, nunca tinha visto uma situação destas e nada justificável, tendo em vista o término da pandemia e, por consequência, o risco à saúde pública e juridicamente então, merece atenção.

E, nesta seara técnica jurídica, resolvi abordar este tema que virou dilema entre os corretores(as) de seguros, devido às inúmeras reclamações de seus clientes, inclusive a minha, pela dificuldade do aplicativo “funcionar” e encaminhar fotos e documentos, sem falar no consumo do tempo para fazer isto.

Pois, bem, é claro que no Brasil para que haja um perfeito funcionamento dos meios tecnológicos (inteligência artificial) se faz necessário investimento e acompanhamento ao segurado.

Vamos iniciar pela análise da responsabilidade da vistoria que é da seguradora, e seus terceirizados, extensão desta, pelo fato de sua expertise em analisar o risco.

Para tanto é dever da seguradora cercar-se de cuidados sobre o real estado do bem segurado, não podendo ser omissa, e não se fala em boa-fé, porque isto faz parte da proposta inicial de aceitação do risco, ou de continuidade da mesma seguradora com troca do bem (endosso).

Na legislação há previsão expressa no artigo 757 do Código Civil, diz que: “Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados”.

Se pegarmos para analisar juridicamente este artigo se extrai a “alma” do contrato entre seguradora e segurado, ou seja, a obrigação do proponente adimplir o prêmio e a garantia do interesse do segurado que é mais importante para o segurado do que a própria indenização a que eventualmente terá direito em caso de haver sinistro.

Porque o segurado não acorda pela manhã com interesse de ter sinistro, o que ele quer é a tranquilidade, a segurança, a garantia dos riscos a que está exposto.

É claro que a seguradora pode se utilizar de inteligência artificial, mas, desde que funcione e a responsabilidade dos aplicativos e terceirizados desde sempre é dela.

Quem melhor para avaliar o risco que a própria seguradora que trabalha e analisa mercado para precificar e escolher o que quer ou não segurar?
Então, se a seguradora não tiver terceirizados capacitados, ou meio por inteligência artificial, a facilitar a vistoria ao segurado, dispense a vistoria e assuma mais uma vez o risco, e as consequências advindas do sinistro, não podendo negar depois a indenização em caso de sinistro, porque afinal de contas o segurado está à disposição para que seu bem seja segurado.

Enquanto a vistoria fica por conta dos robôs, os corretores (as) de seguros se viram nos 30 para resolver tantas pendencias com seus segurados.
E, não poderia finalizar este texto sem uma reflexão:

A IA, é importante para otimizar processos, redução de falhas, auxilia na tomada de decisões das empresas, entre outros benefícios.

Mas, será que o robô está preparado para adversidades de riscos que a prática do dia a dia enfrenta? E, como ficam os milhares de empregos dos prestadores de serviços? E, o uso ou não de IA deveria ser uma escolha do segurado?




Jaqueline Wichineski dos Santos. Advogada. Parecerista. Mestranda em Direito. Especialização Pós-Graduação em Direito de Seguros, pela Fundação Escola Superior do Ministério Público (FMP). Pós-Graduação em Processo Civil e Direito Civil, pela FMP. Secretária Adjunta da CESPC OAB/RS (Comissão Especial de Seguros e Previdência Complementar). Membro do Comitê de análise, da CESPC OAB/RS, projeto de Lei PL29/17. Membro da AIDA BRASIL (Associação Internacional de Direito de Seguros). Membro do GT de Processo Civil da AIDA BRASIL. Membro da Divisão Jurídica e do Conselho da Mulher Empreendedora da FEDERASUL RS e coordenadora Adjunta da Comissão de Seguros da FEDERASUL RS. Membro da Comissão da Mulher Advogada OAB/RS. Membro do IBDS (Instituto Brasileiro de Direito dos Seguros).Experiência na área de Direito Civil, com ênfase em Direito de Seguros, Direito Empresarial, Direito Bancário. Professora de Pós-Graduação. Professora e coordenadora dos cursos de seguros da Escola Superior da Advocacia OAB/RS. Palestrante, possui artigos em Direito dos Seguros, e outros na área Cível.

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