Relatório de Riqueza Global 2022 da Allianz: famílias perderão um décimo de sua riqueza
30.11.2022 - Fonte: Sonho Seguro
Inflação ataca novamente: a poupança brasileira cresceu 9,4% em 2021, impulsionada pelo mercado de capitais, mas bem abaixo da média de longo prazo
A Allianz divulgou a 13ª edição do seu Relatório de Riqueza Global (“Global Wealth Report”), que examina em detalhe a situação dos ativos e das dívidas das famílias em quase 60 países.
Em retrospectiva, 2021 pode ter sido o último ano do velho “novo normal”, com mercados de ações em franca ascensão, impulsionados pela política monetária. As famílias foram amplamente beneficiadas: pelo terceiro ano consecutivo, os ativos financeiros1 globais cresceram dois dígitos em 2021, atingindo 233 trilhões de euros (+10,4%). Nos últimos três anos, a riqueza privada deu um aumento impressionante de 60 trilhões de euros – o que equivale a adicionar duas zonas do euro ao montante das finanças globais.
Três regiões se sobressaíram no crescimento de ativos: Ásia, excluindo Japão (+11,3%), Europa Oriental (12,2%) e América do Norte (+12,5%) – tal como nos dois anos anteriores, a região mais rica do mundo – com ativos financeiros brutos per capita no valor de 294.240 euros contra uma média global de 41.980 euros – atingiu taxas de crescimento semelhantes às dos mercados emergentes. Por outro lado, a Europa Ocidental (109.340 euros) comportou-se mais como uma região madura e rica, com um crescimento de 6,7%.
O principal propulsor do crescimento foi o boom do mercado de ações, contribuindo com cerca de dois terços para o crescimento da riqueza em 2021 e impulsionando os títulos como classe de ativos (+15,2%). As novas poupanças, no entanto, também permaneceram elevadas. Apesar da redução de cerca de 19% em 2021, com 4,8 trilhões de euros, elas ainda permaneceram 40% acima do nível observado em 2019. A composição da poupança também mudou, embora apenas ligeiramente: a participação dos depósitos bancários caiu para 63,2%, mas ainda assim continuou sendo de longe a classe de ativos preferida dos poupadores; por outro lado, os títulos, assim como os seguros e previdências privadas, ganharam uma posição mais favorecida entre os poupadores, mas suas participações nas novas poupanças foram muito menores, com 15,1% e 17,4%, respectivamente. Refletindo essa dinâmica, os depósitos bancários mundiais cresceram “apenas” 8,6% em 2021, ainda assim o segundo maior aumento já registrado (após o salto de 12,5% em 2020). Já os ativos de seguros e fundos de pensão apresentaram uma evolução bem mais fraca, subindo 5,7%.
Ponto crítico
O ano de 2022 marca um momento de virada. A guerra na Ucrânia sufocou a recuperação pós-covid-19 e virou o mundo de cabeça para baixo: inflação galopante, escassez de energia e alimentos e o aperto monetário pressionando economias e mercados. A riqueza das famílias sentirá essa retração. Os ativos financeiros globais deverão recuar mais de 2% em 2022, sendo essa a primeira destruição significativa da riqueza financeira desde a grande crise financeira em 2008. Em termos reais, as famílias perderão um décimo de sua riqueza. Mas, em contraste com o a grande crise de 2008, que foi seguida por uma retomada relativamente rápida, desta vez as perspectivas no médio prazo também são bastante sombrias: o crescimento nominal médio dos ativos financeiros deve ficar na casa dos 4,6% até 2025, em comparação com os 10,4% dos três anos anteriores.
“2021 encerra uma era”, declarou Ludovic Subran, economista-chefe do Grupo Allianz. “Os últimos três anos não foram nada menos que extraordinários. Foi um período de calmaria para a maioria dos poupadores. Não apenas 2022, mas os próximos anos serão diferentes. A crise do custo de vida põe à prova o contrato social. Os formuladores de políticas enfrentam o imenso desafio de superar a crise energética, garantir a transformação verde e estimular o crescimento, ao mesmo tempo em que a política monetária pisa com força no freio. Não há mais espaço para erros na política. A chave para o sucesso são medidas inovadoras e direcionadas a nível nacional, e a unidade da Europa em nível supranacional.”
A volta da dívida
No final de 2021, a dívida global das famílias era de 52 trilhões de euros. O aumento anual, de +7,6%, superou amplamente a média de longo prazo, de +4,6%, e o crescimento de 2020 de +5,5%. A última vez que se registrou um crescimento acima disso foi em 2006, bem antes da grande crise financeira global. No entanto, devido ao aumento acentuado da produção nominal, o rácio da dívida global (a proporção dos passivos expressos como percentagem do PIB) chegou a recuar para 68,9% (2020: 70,5%). A alocação geográfica da dívida mudou desde a última crise. Enquanto a participação dos mercados avançados segue em declínio – a participação dos EUA, por exemplo, caiu dez pontos percentuais, indo para 31% desde a grande crise –, as economias emergentes respondem por uma parcela cada vez maior da dívida global, principalmente a Ásia (excluindo o Japão), cuja participação mais do que dobrou na última década, elevando-se a 27,6%. “O aumento acentuado da dívida logo no início de uma recessão global é preocupante”, disse Patricia Pelayo Romero, coautora do relatório. “Nos mercados emergentes, a dívida das famílias na última década aumentou com taxas de crescimento de dois dígitos, o que é mais de cinco vezes a velocidade observada nas economias avançadas. Ainda assim, os níveis gerais de endividamento parecem administráveis, porém, devido aos fortes ventos contrários que esses mercados estão enfrentando em termos estruturais, há uma ameaça real de uma crise da dívida.”
A mordida da inflação
Os ativos financeiros brutos das famílias brasileiras aumentaram 9,4% em 2021, atingindo 2,6 trilhões de euros, o aumento mais modesto desde a crise financeira e bem abaixo da média de 15,6% dos últimos dez anos. A razão para esse desempenho abaixo do esperado se deve à inflação: a renda disponível das famílias brasileiras deu sinais de enfraquecimento alguns meses antes de começar a morder os bolsos dos mercados avançados. Como consequência, o Banco Central brasileiro começou a aumentar agressivamente as taxas de juros desde 2021.
Como resultado, vimos os depósitos crescerem meros 2,4% no ano passado (comparado com o CAGR ou taxa de crescimento anual composto de 10,5% em dez anos). Os ativos de seguros e previdências privadas também sofreram, com um magro crescimento de 3,3% (contra uma média de longo prazo de 10,6%). Por outro lado, o crescimento dos títulos registrou robustos 12,6%.
No entanto, o passivo registrou aumento de 21% no Brasil, colocando sobre as costas das famílias um ônus de 650 bilhões de euros – com uma taxa Selic de 13,8%, o serviço da dívida será um desafio no atual clima econômico. Mesmo assim, a riqueza líquida das famílias brasileiras cresceu 6%, atingindo 1,9 trilhão de euros. Com ativos financeiros líquidos per capita de 8.940 euros, o Brasil caiu um degrau, passando à 40ª posição no nosso ranking dos 20 países mais ricos.